sábado, 31 de maio de 2014

RETROVISOR

Coreaú, Ce, 31 de maio de 2014 d.C 

Na bucólica urbe de tempos decadente, acordei hoje para uma visita a um amigo. Tião. Quero ver como se encontra o guerreiro neste trinta e um de maio, o mês de Maria, a mãe de todos nós inclusive dele também. Novamente o encontro de olhar fixo no horizonte west. Parado, nada falo, e ao seu lado sento tranquilamente para observar aquele momento de meditação.
Calado ele permanece. Como se não notasse minha presença, alí fica por momentos. Novamente uma lágrima... Ah... aquela lágrima constante. Talvez represada durante tempos. Séculos talvez... Em silêncio permaneço e solidário, mais uma vez também deixo rolar... Uma lágrima...

Minutos se passam... A claridade da luz proveniente do astro rei sobre o palco da vida nesta manhã de esperança e sonhos onde mais um ato da peça retrovisor se desenrola, torna o cenário magico. Indescritível... 

Mansamente Tião quebra o silêncio do ambiente e começa a relatar lembranças e feitos d'outrora ao lado da sua única, verdadeira e eterna Fulô... Ah! Que lembranças! Como se despido do véu da materialidade, sua visão se transporta para a linha do tempo e corre épocas e épocas na história da humanidade para reviver os áureos momentos da vida com único, verdadeiro e eterno amor.

Roma, ano 80 dC. O invencivel pretoriano Tibias chega à sua instancia de repouso para o descanço de mais uma jornada de conquistas. Florentia, linda e rubra como sempre corre até o terraço e recebe seu amor com um abraço dos deuses. Apertado... Repôe as energias do bravo combatente com um doce beijo. Sedento e cansado das lutas ele descansa a sua merecida temporada nos braços de sua estimada e fiel companheira. Mas a posição politica e profissional o reclama às trincheiras da vida e em breve ele retorna à sede do império para servir aos interesses de Titus Vespasianus. É neste momento que Tião afrouxa mais um pouco e aumenta a vazão do canal lacrimal para fazer jorrar sobre o rosto não uma, mas um rio de lágrimas... Ficar longe de Fulô era a mais árdua e difícil batalha... 

As lutas terrenas por fim levam Tibias à pátria espiritual quando já não tão forte como outrora és vencido por jovem guerreiro oponente em mais uma batalha injustificada do império conquistador.

Em breve tempos Fulô também retornaria. E juntos novamente correm de braços dados pelos indescritíveis champs élysées. Desta vez, sem as vestimentas carnais. Unidos pel'alma eles alí passam a ter noção da condição de almas gêmeas que a posteridade lhes iria oferecer em sucessivas jornadas no porvir... E foram muitas... E como os débitos eram enormes havia urgência do retorno.

Roma, ano 130 dC. Ratificando a infinita misericórdia Divina eis que o nosso casal de protagonistas retorna ao exílio terreno, desta vez, não na condição de nobres mas sim como servos da nobreza. A providência superior em sua bondade imensa os tira das inglórias e bárbaras lutas movidas pelo egoísmo humano para os colocar sob a pele de humildes escravos no palácio do grande humanista e governador da época Publios Hadrianus. Não havia mais belo cenário para o novo capítulo da vida material de Titão e Fulô, que naqueles remotos tempos eram nada mais nada menos que os servos Tigus e Fulvia. Sem direito a externalizar a atração que os unia, os dois passam a vivenciar às escondidas nos sombrios corredores do palácio as mais calorosas noite de amor. Atraído pela beleza indescritível de Fulvia, membro inescrupuloso da guarda imperial começa a tentar a bela serva que lhe nega firmemente o mínimo olhar discreto. Diante da relutância, um dia na calada da noite quando Fulvia se dirigia a mais um encontro com Tigus o repugnante guardião ataca a indefesa escrava. Tigus que se aproxima entra em luta corporal com o mesmo, tombando agonizante sob o fio da espada de impiedoso guardião. Para não reviver os sentimentos negativos após o trágico acontecimento, Tião não me relata o que acontecera a Fulvia após o trágico incidente, apenas disse tê-la em pouco tempo recebido na dimensão espiritual a companheira de lutas e glórias...

E mais e mais vezes sempre juntos eles alternaram entre o exílio terreno e a vida na pátria espiritual. Sempre de mãos dadas. Por muitos séculos os mesmos adentraram rumo ao futuro. De nobres a escravos, passando por senhores feudais, até mesmo por religiosos vivenciando encontros furtivos na calada da noite nossos protagonistas caminharam lapidando a alma sedenta por evolução e amor até chegarem à época presente. Época esta que Tião reluta em me descrever, mas que usando de confiança extrema depositada em amigo de longas datas ele me confidencia fragmentos deste ato presente nesta peça cujo enredo denuncia, amor... amor... amor... Somente amor... Ah... Como se não bastasse... Obstáculos... Inúmeros obstáculos...

Brasil, terra do Cruzeiro, segunda metade do século XX d.C. Para poupar figurantes deste enredo, Tião pede reservas quando à precisão de datas e a geografia do lugar, mas deixa a entender que o nosso casal de protagonistas retornara ao exílio em datas e locais muito próximos. Novamente denuncia a extreita ligação familiar e pessoal entre ambos. Desde pequenos infantes a atração era inegável entre eles. Promessas familiares de seus genitores quanto à união dos mesmos até fora feita quando dos momentos sociais onde os mesmo se faziam presentes... Bonito não? Ensaiaram tudo isso na juventude. A troca de energia entre ambos de maneira intensa que só os mesmos compreendem os mantiveram unidos pel'alma apesar dos obstáculos traiçoeiros que o destino lhes apresentara. E é neste ato presente que a história sai do preto e branco para entrar num colorido só... De sonhos, promessas, desejos e atos... Ah... atos... atos que a hipocrisia humana condenaria sem dúvidas nenhuma... E que Tião me pede reserva. Permite apenas que eu diga.

Amor... Troca de energia... Tudo muito intensamente... Intensamente de tal forma que ninguém compreenderia... Só mesmo Tião e Fulô. 

Secando o rosto, não por que acabara a tristeza mas sim talvez o líquido salgado. Ele diz: Por hoje basta! Já sofri bastante. Amanhã reviverei... Se Deus quiser e permitir...

Tenho dito... E sempre!!!

Manuel de Jesus

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